terça-feira, setembro 25, 2007

Mudei(me)

Tenho um cantinho novo. Sem pretensões. Só para partilhar momentos.

sexta-feira, novembro 04, 2005

O Diário

Algo levezinho, escrito quando era mais miúda... divirtam-se! (a Ana e a Taina se calhar reconhecem a estória :P)

Estava a chover. As ruas estavam desertas e o meu chapéu-de-chuva tinha voado. Não podia acreditar que estava a enfrentar aquela tempestade para me encontrar com um estranho!

Tudo começou com aquele telefonema: “Vem ter comigo à biblioteca pelas 15 horas”, e desligou, sem me deixar dizer uma palavra. A voz era-me desconhecida e tinha um sotaque estranho. “Coitado, não deve ter mais nada para fazer!”, pensei eu. Mas a curiosidade é um dos meus defeitos (ou qualidade, quem sabe...), e não consegui resistir. E lá estava eu em frente da biblioteca. Quando entrei apenas vi quatro velhotes, e um deles veio ter comigo e disse: “Estava à tua espera!”

Nunca o tinha visto, nem mais gordo nem mais magro, mas, à medida que ele falava, apercebi-me que sabia tudo acerca de mim: a minha morada, a minha família, o que fazia e onde o fazia, até do meu coelho Óscar, a quem, por acaso, me tinha esquecido de dar de comer, com a pressa de ir ter com o desconhecido.

Finalmente perguntei-lhe: “Quem é o senhor? Como é que sabe tudo isto acerca de mim?” Então ele respondeu, chamava-se Frederic McBride (daí o sotaque esquisito) e sabia tudo aquilo acerca de mim, porque tinha lido o diário de uma rapariga que tinha vivido há uns dois séculos atrás, e que tinha vivido em minha casa. No seu diário falava de mim. Eu desmanchei-me a rir, juro que tentei ficar séria, mas foi mais forte do que eu! Ri-me até não poder mais, quer dizer, até os dois cavalheiros, que mais pareciam umas múmias a olhar para uns velhos calhamaços, resolverem dizer: “SSSHHH!!”

Estava a começar a ficar impaciente. Disse ao senhor Frederic McBride que não conseguia perceber como é que uma pessoa morta podia escrever sobre mim e acrescentei que ele não devia regular muito bem e que isso não era culpa minha, e se ele me tinha feito andar aquele tempo todo à chuva para me falar de diários fantasmas, e se pensava que eu o estava para aturar, que bem podia tirar o seu cavalinho da chuva! O senhor McBride ficou um bocado baralhado: “Mas eu não tenho nenhum cavalo...” Já não estava apenas impaciente, estava à beira de um ataque de nervos: “É maneira de falar, seu inglês idiota!”, e novamente os dois cavalheiros: “SSSHHH!!”, “SSSHHH, para vocês também!!” e dirigi-me para a porta até que o senhor McBride impediu-me, dizendo: “Podes ir-te embora, mas eu preciso mesmo da tua ajuda.” Já mais calma, disse-lhe para me telefonar num dia de sol e saí da biblioteca.

Ao abrir a porta ia caindo para o lado, o sol brilhava e não havia uma única nuvem no céu. O inglês vinha mesmo atrás de mim com um sorriso de orelha a orelha e disse: “Eu não me importo de fazer o tal telefonema, mas não será um pouco desnecessário? E que tal irmos para um sítio onde tu possas falar mais alto?” Tive de me rir, e de concordar com ele: “ Está bem, senhor McBride (“chama-me Fred”, disse ele), vamos para o jardim, é só a um quarteirão daqui.” Lá fomos nós e sentámo-nos num banco debaixo de um grande carvalho. Então ele começou a explicar que a Julia (era assim o nome da rapariga do diário) era a sua tetra-avó, e que no diário que ele tinha descoberto, ela dizia que ia reencarnar numa rapariga chamada Sofia, que iria morar em sua casa, duzentos anos depois. Não podia acreditar! Como era possível alguém conseguir prever que passados dois séculos ela iria ser eu a viver em minha casa? O Fred continuou, disse que não tinha conseguido descobrir o fim da sua história (mais propriamente da minha...) porque o diário tinha desaparecido, mas tudo o levava a crer que tinha sido roubado... “O quê? Mas por que diabo havia alguém de querer roubar um diário velho, só com coisas para contar?” “São mesmo essas coisas que o diário conta que interessam a muita boa gente. A Julia era uma mulher cheia de mistérios e sabia muito acerca de fenómenos sobrenaturais, o seu diário está cheio de informações preciosas que se caírem em mãos erradas...nem sei o que poderá acontecer!...”

Tremi. Seria do frio ou do medo? Foi então que olhei para o relógio e reparei que o tempo tinha voado! “Ai o trabalho para amanhã! Tenho mesmo de ir! Adeus senhor McBride, quer dizer, Fred! Telefone-me amanhã, eu quero ajudá-lo a encontrar esse diário, afinal eu escrevi-o, não foi?”

Cheguei a casa e parecia que tinha sido atropelada por um camião. Tinha a cabeça cheia de pensamentos e não me apetecia nada fazer o que tinha para fazer, aliás nem sequer me parecia uma coisa importante comparado com o que tinha acabado de viver. Decidi ir relaxar. Fui para a casa de banho, para tomar um banho de imersão, cheio de espuma e de pensamentos positivos! Enchi a banheira e despejei quase meio frasco de gel de banho na água morna que ficou logo cheia de bolhinhas. Virei-me para ir buscar uma toalha ao armário e quando fui para a banheira, a espuma tinha desaparecido e estava um livro enorme dentro de água, tinha uma capa de couro e um aspecto velho. Na capa estava gravada a palavra “Diário”. Precipitei-me para a banheira e agarrei o livro, mas era tarde demais! A água tinha levado todas as palavras, restavam apenas manchas sépia, borrões impossíveis de se lerem. Percorri o diário inteiro mas não tinha sobrado nada, até que cheguei à última página, que dizia “ Agora nunca saberão...Limitem-se a que o destino faça o seu trabalho. Assinado, Julia.”